Patrícia Lopes de Oliveira escreve …

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Crônica
TEM COISAS QUE PRECISAMOS ESCREVER PARA NÓS MESMOS


Houve um tempo que tudo era tão simples. Jovens vivendo a vida. Eram muitos amigos. Numa cidade pequena é tão diferente.

Precisamos sempre inventar uma maneira de se divertir. Já fomos a cemitérios a noite. Só para sair correndo feito doidos. Já roubamos placas de trânsito, cones da polícia rodoviária. Já fizemos muitas festas. Brincadeiras dançantes, piqueniques, viagens inesquecíveis.

Lembro do rosto de todas as pessoas que cometeram essas pequenas loucuras comigo. Lembro do riso solto, gargalhadas de madrugada. Do tempo de achar que tudo seria sempre uma grande festa.

Caminhamos pisando em nossas certezas. Lembro dos bailes de nossa cidade. E lembro perfeitamente do primeiro porre. Deitei e minha cama rodava, rodava… Inocente chamei minha mãe que me colocou no banho. Falando até!

Esse momento difícil enterrou o que poderia ser uma fase de muitas bebedeiras. Achei melhor não! Passei a ser a que cuidava dos amigos, que dirigia pra casa em segurança levando um por um.

Fizemos muita bagunça! Íamos a muitos sítios. Lembro-me que uma ocasião todos estavam dentro de um rio e eu sentada embaixo de uma árvore. Fui uma criança que a mãe colocava medo. Se eu dissesse que ia em algum rio. Ela já dizia: Tem cobra, jacaré…

Pra qualquer coisa ela conhecia alguém que tinha morrido daquilo. Se você virasse cambalhota quebraria o pescoço. Minha mãe era exagerada! Tinha medo que eu e meus irmãos morressem. Como se pudesse nos amparar para sempre.

Nesse dia, lá no sítio, me trouxeram um pangaré para eu andar. Eu não dava nada por aquele cavalo. Quando eu ia subindo, uma amiga pediu para ir comigo. Hoje ela é juíza do trabalho. Só que ela apertou com os pés a virilha do animal. Nem Ayrton Sena nos alcançava. Gente como corria e acabamos caindo. Quando cheguei no hospital o doutor Chiquinho me disse: Patrícia, sabe andar de patins? Eu disse: não!
E ele, nem tenta!

Eu vivia no hospital por causa de quedas. Pois é…
Nesse tempo tão intensamente vivido. Fazíamos churrascos que duravam três dias. Já fui de madrugada acordar o dono do açougue. Todo mundo conhecido. Ele resmungava um pouco e nos atendia. E a festa seguia. Tudo era motivo pra muito riso. Tempo de tanta alegria.

Depois em São Paulo, costumo dizer que tive duas adolescências. Tínhamos uma turma imensa. Saíamos quase todos os dias. Shows, cinema, teatro, clubes, boates… E muita história! Fui muito feliz nesse tempo. Tudo nos acontecia. Fomos assaltados uma vez e consegui ficar amiga do aprendiz de bandido. Que desistiu dessa excruciante vida.
O tempo nos trás e leva pessoas.

São fases! Vivi todas elas!
Quando se é jovem tudo é um drama. Quando chega a maturidade tudo é tão simples. Quanta inquietação e aflição pelas paixões platônicas.
O novo nos estimula! As descobertas vão compondo os detalhes de nossas vidas. Eu tinha certeza de que seríamos amigos para sempre. Uns sim e outros não.
Sempre tive uma ingenuidade imensa. Uma credulidade absurda!

Caminho aberto para as decepções. Que fazem parte de nossas vidas. Não devemos alimentá-las. Deixar passar e seguir em frente. Não me apego a coisas ruins. Eu passo por elas! E sempre sai melhor de toda situação desagradável. A vida me deu estrutura para suportar as adversidades.

A vida é muito mais que essas coisinhas pequenas.
Tem dias que ela nos convida a revisitar o passado. Tem dias que um sentimento chamado saudade nos leva além. Esse sentimento tão brasileiro. Esse sentimento tão sorrateiro.
A pouco fiquei sabendo da morte de um amigo dos tempos da adolescência. Ele era dono do “som” que embalava nossas festas. Era mimado! Filho único!

A vida também lhe deu várias fases. Trabalhamos juntos! Nos distanciamos. Mudamos! Cada um seguiu com a sua vida. E hoje nos encontramos diante da despedida. Alguém sempre fica para dizer adeus. Não há palavras! Não ficou nada por dizer. E as lembranças, prefiro as do tempo dos dezessete anos. Mais sinceras, mais verdadeiras. Com o frescor de quem ainda tinha a vida toda pela frente.

A vida nos dá tempo para nos redimir. Para nos resgatar de nós mesmos. Silencia os pensamentos. E vale a pena só o que o amor construiu, edificou. Cada um compõe sua própria história. Que seja leve!

Porque no fim das contas é tudo tão efêmero, impermanente, fugaz…


PATRÍCIA LOPES DE OLIVEIRA
Escreve periodicamente no Blog do Toninho
Formada em Letras e Direito
Pesquisadora em projetos humanitários e culturais

19:26:06

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